11/11/2024 | CULTURA em Revista
Mente Vazia . Maria Teresa Freire
Mente Vazia
A inspiração se foi. As ideias não chegam. A mente vazia nem reage. O olhar vazio recai sobre a folha em branco. Sobre a tela do computador sem palavras. A busca por um tema para escrever incessantemente continua.
A primeira frase se estrutura, mas não há continuidade. Torna-se difícil encontrar o modo como descrever algum sentimento. Procurar nos fatos recentes um impulso para relatar não encontra eco. Nos fatos passados?
Todos tão narrados, descritos, analisados. Nas pessoas? Aquelas amadas, queridas já poetizadas, transportadas para crônicas. Personagens de textos vários articulados com entusiasmo, rapidamente, pois a mente corria célere a frente das mãos responsáveis pelas palavras que traduziam emoções. Agora, nada.
Em que é possível fixar o pensamento para preencher as linhas com atraentes descrições, empolgantes acontecimentos, contagiantes amores, entristecidos desamores?
Na mente se forma a contundente percepção de que a inspiração não vem com o brilhante ou nebuloso alvorecer. Menos ainda com o impactante ou acinzentado anoitecer. Ela vem, simplesmente. Ela não vem, simplesmente. Todavia não desaparece. Confunde-se com as brumas das reflexões sensoriais, escamoteia-se nas redes complicadas que compõem nosso organismo, esconde-se por trás dos nossos sentidos aguçados ou adormecidos.
Repentinamente, ela, a inspiração entra na nossa corrente sanguínea, estremece nossas veias e artérias, jorra por entre nossos dedos e por nossa mente surpreendida. Lança-se, ansiosamente, por meio da caneta nas páginas em branco ou por meio dos toques nas teclas do computador.
E, num vai e vem de verbos, substantivos, adjetivos, advérbios e outros mais, a inspiração nos diz, sussurrante, que qualquer ideia simples é ela se manifestando. É ela transformando a mente vazia em criativa, em que a própria falta de inspiração é a razão para ser traduzida com vontade de descrever o que não se sente, não se vê, não se toca. O que não é.
De um momento para outro a folha branca se preenche, a tela se completa com recortes dos sentidos antes extasiados no nada, agora animados na completude da inspiração aleatória, solta e descompromissada.
A prosa se forma na narrativa brincalhona, romântica, rebelde, grave, crítica, solene, notável. Na poesia de versos delicados, contundentes, perigosos, valorosos, significativos, difíceis, elogiáveis. Sem detalhadamente preparados, a inspiração, solta, irrestringível, sem regras, brinca na mente, atordoando-a, dificultando a transposição para o papel, para a tela do computador, do celular. As ideias vêm aos borbotões, ágeis, ou aos poucos, vagarosas.
Os pensamentos se completam, se chocam, se entremeiam, desaparecem, retornam. E a mente antes vazia, se preenche.
Maria Teresa Freire
Jornalista e Escritora
Presidente da ALB-PR