02/09/2025 | CULTURA em Revista
O Ensino Remoto para Atletas

No Brasil, existe uma injustiça silenciosa que afeta a vida de famílias e de jovens atletas de alto desempenho. Um atleta que tem como horizonte a participação em uma olimpíada ou a profissionalização necessita de dedicação intensa aos treinamentos — que podem chegar a 10 ou 12 horas diárias. É importante lembrar que não é possível alcançar o alto rendimento treinando apenas duas ou três horas por dia.
Entretanto, esses jovens atletas estão em idade escolar, e as famílias são obrigadas por lei a mantê-los na escola. Nesse momento, começa o drama das famílias de atletas: o jovem precisa se dedicar ao esporte, mas também aos estudos. Porém, com raras exceções, não existem escolas preparadas para atender a esse perfil de estudante.
Essa dicotomia entre escola e esporte se torna um verdadeiro tormento para o jovem atleta, geralmente entre 14 e 17 anos, e para suas famílias. As autoridades educacionais costumam recomendar que, nesses casos, o estudante frequente a escola à noite. Contudo, essa solução apresenta inúmeros obstáculos. A maioria das escolas públicas e particulares não oferece mais o ensino médio no período noturno e, quando oferecem, normalmente é na modalidade EJA, cuja legislação restringe o ingresso a maiores de 18 anos. Já quando existem escolas regulares noturnas, a disparidade etária entre os estudantes e o atleta é bastante grande.
Vale ressaltar que a Constituição Brasileira garante de forma inequívoca o acesso à educação de todo jovem cidadão, não permitindo nenhum tipo de discriminação. A Constituição de 1988 não autoriza a supressão de direitos fundamentais em nenhuma circunstância. No artigo 206, está definido que o Estado e a sociedade devem assegurar igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola. Portanto, é dever do Estado e da sociedade encontrar soluções para a condição excepcional dos jovens atletas de alto desempenho.
A experiência contemporânea já apresenta alternativas eficazes para garantir o acesso à educação desses jovens. O ensino remoto surge como a solução ideal para essa situação. O atleta, após longas horas de treinamento, pode chegar em casa, alimentar-se, descansar e, em seguida, assistir às aulas remotamente no conforto de seu lar ou alojamento.
À primeira vista, essa solução pode parecer fragilizada do ponto de vista regulatório. No entanto, essa fragilidade é apenas aparente, pois a Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) asseguram que não se deve criar qualquer obstáculo ao acesso à educação.
Apesar disso, muitas autoridades educacionais não atentam para os dispositivos constitucionais que garantem esse direito e impõem ao Estado e à sociedade a obrigação de oferecê-lo a todo jovem, independentemente de sua origem ou condição.
Assim, o ensino remoto, que não deve ser universalizado, mas aplicado em caráter excepcional, é plenamente adequado para atender quem não pode frequentar a escola regular. A Lei Pelé determina que os entes federados e as escolas estabeleçam normas específicas para o rendimento e o controle de frequência de estudantes que são atletas. É importante destacar que a lei fala em frequência, e não em presença. Portanto, o ensino remoto permite controlar a assiduidade do aluno sem exigir sua presença física em sala de aula.
Conclui-se, portanto, que o ensino remoto destinado a jovens que comprovem sua condição de atletas de alto desempenho está amplamente respaldado por determinações constitucionais de proteção à educação, bem como pelo artigo 85 da Lei Pelé.
Fábio de Visconti-Cortez atua na área da educação há mais de 40 anos. Formou-se em Letras pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e em Direito pela Faculdade de Educação Superior do Paraná (FESP). Sua trajetória profissional sempre esteve voltada para a criação de condições que garantam ao jovem atleta pleno acesso à educação. É autor do livro O Dilema da Escola para o Jovem-Atleta, no qual analisa em profundidade a proteção que a Constituição Brasileira e a legislação infraconstitucional oferecem ao jovem atleta. Atualmente, exerce a função de diretor da área de Inclusão do Colégio Saber.
Membro da Academia de Cultura de Curitiba - ACCUR.