29/10/2024 | AERO em Revista
Camarão Via Aérea
A bordo, uma tripulação inusitada. O comandante Zieminski, um polonês que lutou pela RAF, pilotando caças Spitfire durante a guerra, veio para o Brasil ao final do conflito e adquiriu um Republic RC-3 SeaBee. Com sua alma de piloto de caça, era conhecido pelos rasantes e manobras radicais que encantavam os espectadores. Ao seu lado, Antonio "Neles" Rovedo, um comerciante local, querido por todos na região, com contatos que iam de autoridades a pescadores. Descendente de um dos fundadores da colônia de Superagui, ele herdara o espírito aventureiro de seus antepassados.
A ideia do empreendimento veio de Rovedo, prontamente aceita por Zieminski. As contas eram simples: com cem quilos de camarão graúdo, o lucro já seria excelente. Com o avião, fariam várias viagens por dia, alcançando locais que outros sequer consideravam. Durante meses, voaram diariamente para Guaraqueçaba, Antonina, Superagui e outras enseadas, onde a pesca artesanal de camarão era comum. Enquanto a concorrência usava barcos, lentos em comparação aos 220 km/h do SeaBee com motor Franklin de 215 hp, os dois iam cada vez mais longe em busca de camarões maiores e melhores.
O sucesso trouxe imprudência. A manutenção da aeronave era negligenciada e soluções improvisadas eram frequentes. Rovedo, conhecido por suas invenções, chegou a substituir o sistema hidráulico do trem de pouso por partes de uma bicicleta, e quando precisavam pousar em terra, ele pedalava para baixar o trem e travá-lo com uma chave de fenda. Zieminski, confiante em suas habilidades e na robustez do SeaBee, aumentava a carga e forçava a decolagem cada vez mais.
Os sócios começaram a planejar a expansão do negócio, incluindo a compra de um bimotor anfíbio PBY Catalina, com maior capacidade. No entanto, no auge da temporada de camarão, eles exageraram na carga, e o anfíbio não conseguiu decolar. Acabaram navegando as quinze milhas como se fossem uma lancha veloz, o que danificou seriamente a estrutura da aeronave, tornando os voos com carga perigosos.
Sem o avião, o negócio não podia continuar. Decidiram vendê-lo e seguir caminhos separados. Zieminski sabia de Herbert Cukurs, um famoso aviador letão que operava dois Seabees na represa de Guarapiranga, em São Paulo, e fez a venda. Cukurs pretendia usar o PP-DLV como fonte de peças para manter suas aeronaves voando, e seu negócio continuou até 1996, nas mãos de seus filhos.
Com o dinheiro da venda, Zieminski abriu uma empresa de táxi aéreo, enquanto Rovedo montou uma destilaria de uísque (não exatamente legalizada). Anos depois, o destino reuniu os amigos em um novo negócio. O principal cliente do táxi aéreo era um famoso artista carioca, que encomendava uísque para suas festas. Enquanto todos acreditavam que a bebida vinha de Santos, na verdade, eram caixas do "Johnny Walker Rovedo", transportadas de Paranaguá, que faziam a alegria dos dois "amigos de fé e irmãos camaradas".