31/10/2024 | AERO em Revista
O Paraquedista «Voluntário»
Em 1º de novembro de 1925, o 2º Tenente Antônio Pereira Lima entrou para a história do paraquedismo brasileiro de forma inusitada. Nascido em 1899, em São Paulo, Lima era negro em uma sociedade que ainda sentia os efeitos da abolição da escravidão. Em 1917, ele se voluntariou para a Força Pública Paulista (atual Polícia Militar do Estado de São Paulo) como soldado e, durante a Revolução de 1924, permaneceu fiel aos poderes legalmente constituídos.
Devido à sua atuação exemplar, foi promovido a Aspirante-a-Oficial e ingressou no Curso Especial Militar, que funcionava onde hoje está o COPOM/SP. Em 1925, Lima se voluntariou para a Esquadrilha de Aviação da Força Pública Paulista, sendo um dos 10 selecionados para fazer parte da unidade. Ao mesmo tempo, cursava a Escola de Oficiais, combinando treinamento militar com aulas práticas de aviação.
A relação de Lima com o paraquedismo começou em 1º de novembro de 1925, quando um evento beneficente, promovido para arrecadar fundos para a construção do Hospital Cruz Azul, organizou o primeiro salto de paraquedas da América do Sul. A paraquedista contratada, a francesa Janette Caillé, adoeceu no dia do evento, colocando em risco o espetáculo e a arrecadação de fundos.
Diante dessa situação, o Comandante Pedro Dias de Campos pediu um voluntário entre os oficiais-alunos aviadores para substituir a francesa no salto. Nenhum oficial se apresentou, mas o Comandante apontou para Antônio Pereira Lima, que, mesmo sem preparo, foi escolhido para realizar o salto. Naquele dia, o paraquedas havia sido testado apenas uma vez, com um saco de areia que caiu direto no chão, aumentando ainda mais o nervosismo da situação.
Vestindo o macacão branco e o capacete da paraquedista, Lima subiu a bordo de um biplano pilotado por Orton Hoover, um veterano da Primeira Guerra Mundial. No momento do salto, Lima hesitou e, agarrado à estrutura do avião, se recusava a saltar. Após algumas manobras acrobáticas do piloto, a força da gravidade fez com que ele caísse da aeronave, com o paraquedas finalmente se abrindo.
No entanto, o tirante do paraquedas estava mal colocado em suas virilhas, causando uma forte dor em Lima durante a descida. Ainda assim, ele conseguiu pousar, perfurando a capota de um carro estacionado, o que suavizou o impacto. Ovacionado pela plateia, Lima foi carregado pelos colegas até as autoridades. No entanto, o coronel Pedro Dias o repreendeu por ter saltado de pernas abertas e o responsabilizou pelo conserto do carro danificado.
O salto improvisado fez de Antônio Pereira Lima o primeiro paraquedista brasileiro. Sua carreira continuou com heroísmo, participando da Campanha de Goiás em 1926, quando sofreu um grave acidente aéreo em Uberaba, Minas Gerais. Ele sobreviveu após oito dias em coma, mas o piloto da aeronave faleceu. Lima também participou das Revoluções de 1930 e 1932, defendendo São Paulo e o Brasil.
Após 32 anos de serviço, ele se aposentou em 1949 como Tenente-Coronel. Faleceu em 1978, aos 79 anos, no Hospital Cruz Azul de São Paulo, que ajudou a financiar com seu salto histórico. O legado de Antônio Pereira Lima permanece vivo, com seu nome homenageado em uma rua na zona norte de São Paulo e como patrono do 2º ano da Academia de Polícia Militar do Barro Branco.